A Costa à espera do bom tempo … mas…
Primavera teima em se manter cinzenta e fria, mas na Caparica não há sobressaltos. O bom tempo há de vir, como sempre
Calção vermelho, sweatshirt amarela, pés nus na areia, Cléber olha as ondas, atento. Mesmo com a bandeira vermelha, andam ali à vontade mais de uma dezena de surfistas, naquela azáfama alegre de onda acima, onda abaixo. Mas o ar está fresco, o dia cinzento, o areal vazio. Só as cadeiras empilhadas e os chapéus de praia alinhados estão ali a dizer que não é inverno.
“Está frio, o pessoal não vem, só os surfistas”, diz, filosófico, Cléber, o nadador-salvador da pequena praia Paraíso-Tarquínio, na Costa da Caparica. “No ano passado, por esta altura, eu já tinha feito aqui uns oito salvamentos”, conta ele no seu português cantado do outro lado do Atlântico.
Este ano, as coisas estão um pouco diferentes. A época balnear já começou há mais de uma semana e o verão está aí à porta, mas a primavera teima em não arrancar, com as temperaturas máximas nas últimas semanas a ficarem-se entre três a sete graus abaixo da média para a época, e com umas chuvadas frias pelo meio.
Enfim, “está tudo calmo”, mas Cléber também gosta de ver a “sua” praia cheia, gosta do trabalho e da atenção que isso lhe exige. “Para a semana parece que já vai melhorar, espero que sim, estar aqui parado não é bom”, diz com um sorriso tranquilo de quem, na verdade, não está preocupado. “Não adianta se preocupar, não é? A gente não escolhe o tempo”.
Cléber não está só no modo de pensar, nesta terra que a partir de abril, maio, consoante as sortes do tempo, vive do mar, do sol e de tudo o que anda à volta disso: o turismo, com os hotéis e os restaurantes, as esplanadas e bares, as lojas de souvenirs e de material para o surf, de chapéus e toalhas de praia.
Pedro Monteiro, o dono do bar Tarquínio, logo ali em cima do paredão e do areal, e de um restaurante um pouco mais recuado, tira os óculos de sol, e confirma: “Com este tempo, as pessoas não se sentam nas esplanadas, isso é evidente”. Nada que o preocupe. “Não vale a pena”, diz, “não tenho poder sobre o tempo”. Por isso, é só esperar que a meteorologia mude, o que acabará por acontecer, mais dia, menos dia. “Parece que é já para semana”.
Mais camisolas de inverno
Nas ruas meio vazias da Costa da Caparica o dia avança sem pressas. Há quem se exercite em corridas lentas ao longo do paredão, bicicletas passam para cá e para lá, casais passeiam-se de mão de dada.
Carlos Ferreira, pescador, e o primo, José dos Santos Rodrigues, já reformado, estão sentados num banco de pedra, frente ao mar, a conversar. São ambos da terra, já ali viram todas as meteorologias, e numa coisa concordam: “O tempo é que manda aqui na Costa”. Mas nem por isso se admiram desta primavera cinzenta. Carlos está mais preocupado com o “pouco peixe que há no mar”. A José indigna-o a falta de duches e de casas de banho públicas junto à praia. “Quem precisa tem de pagar, está mal”, diz. Eles sabem que as praias vão encher-se assim que o bom tempo vier – e a vida segue o seu rumo.
Na loja de roupa e equipamentos de surf Samadi, Rui Flores, o gerente encolhe os ombros, com um sorriso. “O inverno também foi atípico, os padrões da meteorologia estão alterados”, diz. “Se o tempo não está bom, temos que diversificar. Eu, por exemplo, deixei ficar mais tempo as roupas de inverno, para compensar”. Quanto, a Vítor Aires, que gere uma loja de artigos de futebol numa das ruazinhas da vila, também ele se diz tranquilo. “Mesmo que chova, os turistas estão cá e não se vão embora”. Mahin e Rahman, do Bangladesh , parecem ser os únicos mais apreensivos. Estão ali a trabalhar, na esplanada de um café – Mahin há 20 dias, Rahman há dois meses – e têm tido pouco que fazer. “Bad weather, bad business”, dizem no seu inglês rápido, olhando a esplanada vazia. Eles sim, parecem ansiosos pelo bom tempo.
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